domingo, 23 de junho de 2013

Entrevista com Paulo André para o LANCE!: "A Copa não fez bem para o Brasil"

Entrevista de domingo: Paulo André


Com Marcelo Braga, Marcelo Damato e Thiago Perdigão
São Paulo

Idade: 29 anos
Lugar: CT do Corinthians, na quinta-feira
A favor: das manifestações pacíficas pelo Brasil e de uma nova estrutura no futebol nacional
Contra:  PEC 37 e a Copa do Mundo de 2014

Uma imagem que não existiu e provavelmente não existirá não sai da cabeça de Paulo André nos últimos dias:

– Estaremos concentrados até quarta-feira e brinquei com o Alessandro, que está vibrando com a movimentação popular: “Imagine se a gente pega uma van e para no meio do protesto com metade do time, que legal seria” – disse ele.

– É óbvio que o Tite não vai deixar, há os outros interesses, mas seria um sonho. Seria coçar o pé do Sócrates ver o Corinthians à frente de outra manifestação – afirmou.

Jogador brasileiro mais engajado em questões sociais e políticas de sua geração, o corintiano falou ao L! e, dentre outras coisas, revelou que o Paulistão quase sofreu uma greve entre os jogadores e que mudou sua ideia sobre a Copa.

– Acho que ela não fez bem ao Brasil. Não estávamos preparados – disse ele, que adotou como causa a protestar a votação da PEC 37 (veja a foto), que acabou sendo adiada para julho.


Foto: Renato Cordeiro/LANCE!Press



LANCE! Você se manifestou a favor das manifestações. É hora de os atletas se unirem pela causa?
Acho fundamental, pois a sociedade se espelha na gente para chegar em algum lugar, como ídolo, herói ou prova de superação. Tenho certeza de que quando disse que apoio o movimento pacífico, que sou contra a violência mas que estou junto deles nas reclamações, muitas pessoas que gostam de mim começaram a entender melhor o movimento. A força dos atletas é grande, mas mal explorada.

L! Nas Diretas Já, Sócrates, Casagrande e Cia. subiram em palanques. O que dá para fazer?
Uma vez que você tem consciência política e posicionamento, pode se expor e colocar o seu na reta. Mas não dá para sair do zero ao cem de uma hora para outra. Se o atleta não tem coragem de falar que o trabalho de alguém é bom ou ruim, não é agora que vai sair falando. O momento é interessante para que se conscientizem do seu poder, que é preciso entender mais de política e gestão para se posicionar. Vale só apoiar? Vale muito. Os jogadores hoje são capazes de fazer só isso.

L! Alguns opinaram na Seleção Brasileira. O que achou?
Quem apareceu foi pressionado e exposto. Você está na Seleção, no olho do furacão e te perguntam, você é obrigado a responder. Deviam fazer mais vezes, em mais causas, alertar o povo de que há a necessidade de melhoria. Não preciso defender tudo, mas no que concordo, por que não me expor? Você não vai agradar a todos. Foi o maior aprendizado que tive com Sócrates.

L! O que ele te falou sobre isso?
Quando perdemos para o Tolima (na Libertadores de 2011), saímos do CT apedrejados. Pensei: "Não sou bandido". No ônibus já fui pensando no texto, foi um dos primeiros que escrevi, mas estava inseguro. Primeiro porque jogador escrever já é esquisito (risos). Segundo que, no pior momento da história do clube, vou ser contra a torcida? Liguei para o Doutor e mandei o texto por e-mail. Ele leu, me convidou para ir à casa dele, e me disse: "Essa é uma decisão tua, mas só quero que entenda que tua causa não pode ser maior que a paixão do corintiano. O resto você está coberto de razão". Voltei para casa, fiz mudanças e soltei o texto. "Apanhei" de muita gente, mas comecei a chamar a atenção para um lado que ninguém conhecia. Mas bem embasado, às vezes vale a pena.

L! Seu discurso pode influenciar mais jogadores a darem opiniões?
Já fui mais sonhador, que poderia influenciar os próximos a mim, mas acho que talvez influencie a próxima geração. Ela vai ver que é possível ser jogador e pensar fora da caixinha. Vejo muito medo de diretoria, dos clubes, da torcida. Vou jogar mal e falhar, então meu telhado é de vidro. Aguento brincadeira: "Vai pintar! Ganha bem e fica aí reclamando". É uma consequência...

Foto: Reginaldo Castro/Lancepress

L! Você compartilhou na internet o editorial do L! que pede mudanças na estrutura do futebol. Por quê?
Concordo com praticamente tudo. É uma das minhas ideias mudar o futebol. Primeiro mudar o país, que é o que se fala hoje, mas há três anos faço críticas para mostrar que o calendário é ruim, que a CBF não executa seu trabalho de forma adequada, que as federações não se preocupam com os clubes do interior. Quando li, me senti representado. Vejo que o movimento ganha força. O modelo de formação de atletas do futebol brasileiro é ultrapassado, então é um grande momento para irmos nesse caminho e tentar mudanças pontuais para se desenvolver e voltar a crescer como o país do futebol.

L! Você é a favor da realização da Copa do Mundo de futebol no Brasil no ano que vem?
Quando ela chegou, fiquei feliz, era um sonho. Todo mundo gostaria de ver a Copa aqui e ganhá-la, mas o projeto inicial do governo era que a iniciativa privada tocasse a maior parte das obras, que todo o desenvolvimento de infraestrutura e mobilidade urbana fosse feito assim. Depois de algum tempo você percebe que não aconteceu isso. Nada mais justo do que mudar de opinião. Hoje, foram gastos mais de R$ 28 bilhões e não há legado estrutural. Ficam os estádios, todos lindos e bem feitos, mas onde foram gastos mais do que se devia. E você vê a dificuldade nos aeroportos, com quase nenhuma obra concluída. Quando tiro um pouco a cabeça do futebol e olho por cima, acho que não fez bem para o Brasil. Não estávamos preparados para isso. Tinham mais coisas importantes do que a Copa e as Olimpíadas para que melhorássemos antes.

L! O Corinthians está envolvido na Copa. Nunca te silenciaram?
Não. Uma vez o Andrés (Sanchez, ex-presidente) falou que primeiro eu tinha de jogar para depois falar, porque eu estava machucado. Ele estava na CBF e eu era contrário às decisões. Faltavam projetos a longo prazo. Foi a única invertida que tomei. Tenho um grande apreço por ele, mas continuarei falando porque são minhas opiniões, é ideológico.

L! O que projeta para o futuro?
Brinco que um dia vou se presidente da CBF. Ou melhor, da Liga.

L! Prefere o modelo de ligas?
Seria mais interessante para o futebol. Porque teriam menos cargos políticos e mais cargos técnicos na direção.

L! Qual seria sua primeira medida?
São tantas (risos). É necessário planejamento. Onde queremos estar em 20 anos? Que futebol queremos jogar? Um bonito como o da Espanha? Como o de 1970 ou de 1982? Vamos capacitar pessoas para que, dentro de clubes e federações, capacitemos esse tipo de atleta. O resultado virá em alguns anos. É função da CBF investir para atingirmos o tipo de futebol que se quer. Hoje ela cuida do Brasileirão, da Copa do Brasil e da Seleção, mas vejo um vácuo grande de vontade de querer melhorar o produto que eles têm na mão. Na Seleção há pressão, mas nos torneios não se pensa em melhorar o nível.

L! Faltam bons técnicos de base?
Já é necessário, mas em algum momento vão perceber que a capacitação dos profissionais que trabalham com futebol é urgente. Além do currículo de educador físico, é necessário um curso da CBF, como é feito em toda a Europa. Que se capacite pessoas para trabalhar com crianças dos 10 aos 12, dos 12 aos 15 e dos 15 aos 17, cada nível com sua graduação e elementos básicos de aprendizado. Isso com uma linha central para desenvolver o trabalho desejado.

L! Acha que os jogadores deveriam participar mais das decisões?
Sim, não só no futebol, mas em todos os esportes. Hoje, é muito engessado o modelo político de federação e confederação. O jogador não tem voz. Na última vez que teve greve na NBA (liga de basquete americana), quem representou os atletas foram Kobe Bryant, LeBron James e outros seis dos melhores. São esses que podem dar a cara a tapa. Aqui são os de Corinthians, Palmeiras, São Paulo, Cruzeiro, Inter...Temos de fazer em benefício de quem vem atrás. Se hoje tenho essa visão, foi porque joguei no Taboão da Serra e ganhei R$ 180 mensais por um ano. Joguei no CSA (AL) e não tinha o que comer. Me formei dentro do São Paulo, mas minha parte educacional foi ruim. Que tipo de atleta estamos formando? Quando pegam o microfone, não conseguem dar entrevista. Mas o atleta profissional hoje é reflexo da sociedade. O ensino público é ridículo.

L! O sindicato te representa?
Já troquei farpas com eles. Em 2010, tentei ajudar com ideias, mas as coisas não andaram. Não nos perguntam sobre o calendário, as férias, a preparação. Em 2012, quando o Palmeiras foi agredido, fui o único jogador a dar entrevistas falando do absurdo. O sindicato me chamou de pseudo-politizado. Mas esse ano melhorou muito. Criaram um conselho para atletas de cada time irem às reuniões. Quase fizeram uma greve no Paulistão, que foi apoiada por todos, pela violência contra o Guarani e Palmeiras. Infelizmente não ocorreu, mas nós éramos a favor dela.

L! Se votasse em 2015, quem apontaria como presidente da CBF?
Tem de ser alguém preparado e com visão para o longo prazo, com capacidade de gestão diferenciada. Hoje não vejo nenhum ex-atleta com competência para assumir o posto.

L! Os protestos vão parar? E é melhor torcer contra o Brasil na Copa das Confederações, pelo impacto?
Não, de jeito nenhum, eles têm de aumentar. Não eram só pelos vinte centavos, né? Reduziram a tarifa, mas era o mínimo. E temos de torcer a favor do Brasil. Aquele sentimento que a Seleção não representava o povo se inverteu. Estão dispostos a lutar e, mesmo assim, apoiar a equipe. Mesmo discordando da CBF e do gasto excessivo do dinheiro público.


 

Sócrates: conselheiro e grande encorajador


Paulo André conheceu Sócrates através da esposa dele, Kátia Bagnarelli, de quem é amigo de infância. Durante quase dois anos, estabeleceu um forte laço de amizade.

O Doutor, como era chamado o ex-jogador morto em 2011, o presenteou com dois livros: um romance sobre o nazismo, chamado "Guardião dos Gentios", e outro sobre a máfia russa no futebol.

- Não sei se sou discípulo dele. Ele era fechado a novas amizades, mas jantamos algumas vezes, fui em festas de aniversários na casa dele. Falávamos horas de de futebol e de sociedade. Ele foi muito grande, tinha muito mais conteúdo e consciência política do que eu - disse.

Por várias vezes, o ex-jogador deu conselhos a Paulo André, como ele conta na entrevista ao lado [acima].

- Voltei da França enxergando muito potencial no Brasil, mas pouco explorado. Conhecer ele foi um "up", ele tinha uma visão muito mais social e popular de tudo o que eu queria fazer. Foi um conselheiro e um cara que encorajava. Ele via que eu podia fazer o que ele fez ou até coisas que talvez não conseguiu fazer - analisa Paulo.


 

Paulo André critica e elogia amigo Ronaldo


Paulo André e Ronaldo são amigos dos tempos de Corinthians. Em 2012, porém, após a queda de Ricardo Teixeira, o zagueiro disse não ter aprovado a aproximação do Fenômeno com o cartola, o que irritou o ex-atleta. As opiniões, porém, não mudaram. Nem a amizade.

- Em alguns momentos ele foi claro nas suas posições. Não a todo momento, mas nos mais importantes mostrou a função dele. Foi transparente e claro na conduta. Não está ali (no COL) por dinheiro. Quer desenvolver o futebol - disse.

Fonte: LANCE!Net

2 comentários:

  1. meu caro Paulo André, apesar de ser corintiano e gostar de vc como jogador do Corinthians, acho que esta redondamente equivocado sobre as informações sobre a copa do mundo, e mais, acho que vc esta sendo usado por uma imprensa totalmente parcial que existe no Brasil, só para te citar um ex, vc diz que estão sendo "gastos" 28 bi em estádios? ou vc só lê a mídia tradicional que faz oposição ao governo? vou te dar um ex...sou paulista e moro em Manaus, o aeroporto esta sendo triplicado de tamanho e capacidade, assim como a rede hoteleira que se expandiu muito nos últimos 2 anos com a construção de vários hotéis, Amazonas era isolado da rede elétrica do país e agora chegou o linhão de Tucurui que ira ligar Manaus com o resto do país, e junto com o tal linhão vem também mais um cabo optico de banda larga de internet, que também é deficiente no estado, sem contar que mesmo com o gasto de mais de 500 milhoes no estádio, com isso pode vir a ressucitar o futebol amazonense, e outra, como podemos calcular o que pode trazer de turismo para cá uma exposição de uma metrópole no meio da maior floresta tropical do mundo para mais de 4 bilhões de espectadores na transmissão da copa do mundo, este é um ex só de uma sede, e mais, no futuro vai se provar que estas manifestaçoes se iniciou com uma louvável reivindicação e foi tomado por um movimento conservador e reacionário que nofuturo muitos terão vergonha de ter participado disso, espero que vc não caia nessa, abs

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oi, Julio!

      Em primeiro lugar, obrigada por comentar no meu blog.

      Realmente uma Copa do Mundo pode trazer grandes benefícios para o país, especialmente para Manaus, como você citou. Ou, pelo menos, era o que eu achava. Acho que o que o Paulo André quis dizer, assim como os protestos, é que a gente deveria ter resolvido nossos problemas internos antes de se pensar em trazer uma Copa das Confederações/Copa do Mundo. Se o governo tem dinheiro para isso, por que não teve para investir na educação, na saúde, nos transportes e outras tantas questões? E quanto aos estádios, quem é que vai cuidar deles depois que as competições acabarem? É de se pensar.

      Abraços

      Excluir